O quarto ideal para um jovem com autismo
Onde: • 06 de Novembro - 2024 | Fotos Camila SantosOs princípios da Neuroarquitetura usados para atender as necessidades especiais para o Transtorno do Aspecto Autista
A arquiteta Alessandra Gandolfi participa pela segunda vez de uma mostra com um espaço projetado para um jovem autista. A primeira foi em Curitiba, na Casacor Paraná, e agora na Casacor Espírito Santo. Utilizando o conhecimento que tem de Neuroarquitetura e sua própria experiência como mãe de dois filhos neurodivergentes, Alessandra projetou o ambiente para atender as necessidades sensoriais, emocionais e comportamentais de um jovem com autismo: paleta de cores de tons neutros e suaves; luzes indiretas e ajustáveis; áreas definidas para dormir, estudar e relaxar; móveis bem fixados com quinas arredondadas, entre outros detalhes. Para desenvolver o conceito do ambiente a arquiteta tirou partido da música, hiperfoco que reflete a personalidade do adolescente e que também representa a riqueza cultural do Espírito Santo.
“Acredito que vivendo com consciência, responsabilidade e respeito pela diversidade, podemos deixar um legado positivo para o futuro”, comenta a profissional, que é veterana na edição paranaense da mostra.
Uma das mais conhecidas manifestações culturais capixabas vira referência na suíte: a casaca. Com influência africana, esse instrumento musical é um dos principais componentes de percussão das típicas bandas do Congo do Espírito Santo. Sua produção é fruto do artesanato local: talhada em madeira, os artesãos esculpem uma cabeça humana no topo (com traços africanos e cabelos índigenas), sendo o corpo de onde se tira o som, e o pescoço o local para segurar o instrumento. O som é produzido pelo atrito ao correr a vareta pelos talhos feitos na parte do corpo.
Em colaboração com Domingos Teixeira Marques, um prestigiado artista local que há mais de 50 anos trabalha na confecção de casacas, a arquiteta desenvolve uma obra de arte interativa. Inserida à frente da cama, as peças que a compõem possuem cabeças e cilindros esculpidos em madeira e detalhes pintados com tintas coloridas. O cabideiro do quarto também conta com uma escultura de casaca gigante. Além de serem objetos de referência, esses elementos permitem que a criança interaja com o espaço físico em uma grande brincadeira.
Os traços do universo musical aparecem em outra proposta assinada pela profissional. Atrás da cama, o painel de madeira faz uma representação dos instrumentos musicais - objetos que são afetivos para esta criança. Os elementos são esculpidos por um delicado trabalho de marcenaria e dispostos de forma abstrata em diferentes relevos, conferindo um efeito personalizado. Essa é uma das assinaturas da arquiteta, que sempre busca criar projetos autorais, únicos e especiais.
Em mais uma solução lúdica, Alessandra desenhou um mural de rotina personalizado que funciona como uma espécie de jogo da memória para facilitar a previsibilidade necessária para os autistas. Feita em madeira, a estrutura conta com cards que ilustram todas as suas atividades diárias, do café da manhã à hora de dormir. “As placas são removíveis e podem ser montadas por ele mesmo para que possa estruturar seu planejamento do dia seguinte. Além de otimizar as tarefas cotidianas, esse mobiliário fortalece sua independência e autonomia”, explica Alessandra.
O projeto abrange mais soluções neuroinclusivas que priorizam o bem-estar, como o armário fechado para que os itens pessoais não fiquem aparentes, a cama orgânica com fácil acesso e puff lateral, banco para se trocar, ducha manual e barra de apoio.
A biofilia se soma a futons aconchegantes e um pórtico acústico para criar um refúgio que abraça, ideal para ouvir música, tocar instrumentos ou ler um livro. Além do jovem gostar de apreciar o som das ondas, o isolamento acústico é outro ponto crucial no espectro autista. O quarto conta com o sistema Inovawall, uma tecnologia de redução de ruído; e o teto é confeccionado em ecochape, um material ecologicamente correto que contém 70% de PET reciclado e minimiza as interferências sonoras externas.
A abundante iluminação natural foi aproveitada ao máximo e o forro não recebeu iluminação para garantir conforto visual. O projeto luminotécnico é aplicado de forma indireta nos painéis e no mobiliário, executado 100% em LED de tom amarelado (2700k). Toda a ambientação equilibra cores que acalmam com linhas retas e formas orgânicas, enquanto as texturas naturais (como madeira, pedras e tecidos) proporcionam integração sensorial.
O layout limpo, cuidadosamente setorizado, é dividido em áreas para dormir, relaxar e vestir numa estética minimalista com toques rústicos. Esse estilo clean proporciona conforto necessário, uma vez que a organização é essencial para o dia a dia de uma pessoa neurodivergente.
Serviço
Alessandra Gandolfi Arquitetura & Interiores
@alessandragandolfi_